CPI dos Atos Antidemocráticos indicia 135 envolvidos e livra general G. Dias

Após nove meses de trabalho, os deputados da Câmara Legislativa (CLDF) encerraram a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Atos Antidemocráticos indiciando 135 pessoas. Ao longo das sete horas de leitura do resumo do relatório elaborado pelo distrital Hermeto (MDB) houve momentos de tensão. O mais tenso evoluiu para um bate-boca e o presidente da CPI, Chico Vigilante (PT) interrompeu os trabalhos. Ao final, o documento, de 444 páginas, foi aprovado por seis votos a um pelo integrantes da CPI, enquanto o destaque que livrou o general Gonçalves Dias, o G. Dias, passou com quatro votos favoráveis e três contrários.

O relatório deverá ser publicado no Diário da Câmara Legislativa (DCL) antes de seguir para análise do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT). Uma reunião entre Vigilante e o procurador-geral de Justiça do DF, promotor Georges Carlos Fredderico Moreira Seigneur, deve ser marcada para os próximos dias. Caberá ao órgão decidir se vai ou não oferecer denúncia contra os 135 nomes apontados pela CPI ao Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT). Chico Vigilante adiantou que a comissão também pretende conversar com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, para tratar sobre o relatório.

O relatório incluiu recomendações ao Poder Executivo local, no sentido de melhorar as condições de trabalho e a atuação das forças de segurança do DF (veja quadro).

Atos de selvageria em 8 de janeiro deixaram rastro de destruição nas sedes dos Três Poderes

A retirada do nome do ex-ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) G. Dias do rol de indiciados foi motivo da forte discussão que resultou na interrupção da sessão por 15 minutos. O nome de G. Dias era dado como certo na lista de indiciados, principalmente porque a oposição (ao governo local) era minoria na comissão. Durante a leitura do voto do relator, Vigilante, citando o regimento interno da Casa, afirmou que havia a possibilidade de propor mudanças no texto do relator Hermeto (MDB), por meio de destaques.

E quando Vigilante disse que faria um destaque justamente pedindo a retirada do general, distritais da direita — Pastor Daniel de Castro (PP), Joaquim Roriz Neto (PL), Thiago Manzoni (PL) e Paula Belmonte (Cidadania) — protestaram e entraram em um embate com deputados de esquerda — o próprio Vigilante, Fábio Felix (PSol) e Gabriel Magno (PT). O presidente da comissão se viu, então, obrigado a dar um prazo para que os demais parlamentares também apresentassem destaques para modificar o relatório. Por saber que Vigilante teria votos suficientes para exonerar G. Dias e como gesto de repúdio, o deputado Pastor Daniel de Castro (PP) e o suplente Thiago Manzoni (PL) protocolaram um destaque pedindo a remoção de todos os 135 indiciados. Fora a liberação de G. Dias, nenhum outro destaque para modificar o relatório foi aprovado.

A estrutura do relatório elaborado por Hermeto é sustentada em citações de uma reunião entre integrantes da Polícia Federal (PF) e da Secretaria de Segurança Pública (SSP-DF), em 7 de janeiro. Na ocasião, o diretor-geral da PF, Andrei Passos, externou a preocupação sobre a vinda de caravanas em direção a Brasília para uma manifestação, naquele fim de semana. A PF sugeriu o fechamento da Esplanada dos Ministérios ao então secretário-executivo da SSP-DF Fernando de Sousa Oliveira. O pedido não foi aceito pela cúpula da secretaria.

Mesmo a pasta sendo chefiada, à época, por Anderson Torres, o emebedista atribuiu toda a culpa dos atos a Oliveira e a coronel Cíntia Queiroz, subsecretária de Operações da SSP-DF. Ela continuou na função e seguirá no cargo, de acordo com o atual secretário de Segurança, Sandro Avelar. Para o relator, a dupla recebeu a informação repassada pela PF, mas agiu com falta de proatividade frente às informações de que o pior estaria por vir. “Gerou significativas lacunas nas estratégias de segurança das instituições, órgãos e agências envolvidas nos atos do dia 8, afetando diretamente a capacidade das forças de agirem de maneira adequada”, escreveu Hermeto.

Para Oliveira e Cíntia, o relator imputou os crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito; golpe de Estado; dano qualificado pela violência e grave ameaça, com emprego de substância inflamável, contra o patrimônio da União e com considerável prejuízo à vítima; e deterioração de patrimônio público.

No relatório, Bolsonaro foi citado 40 vezes, mas Hermeto não propôs o indiciamento do ex-presidente, salientando que não encontrou evidências sólidas ou informações concretas que pudessem incriminá-lo.

Apesar disso, Hermeto escreveu que o ex-presidente construiu uma narrativa, ao longo dos quatro anos de governo, de tentar descredibilizar as eleições no Brasil, reiterando, por diversas vezes, a possibilidade de fraude nas urnas eletrônicas. “Com esse roteiro, Bolsonaro conseguiu instilar, em seus eleitores, uma visão simplificada da realidade política criada, em parte, pela desinformação. Estabelecendo uma dicotomia entre princípios e valores positivos e negativos, ele moldou em seus seguidores a percepção de que sua não reeleição seria fruto do cenário por ele mesmo delineado durante todo seu mandato”, assinalou o relator.

O parlamentar considerou que o fato mais significativo relacionado aos atos de 8 de janeiro decorreu do “protagonismo político recebido pelas Forças Armadas” durante o governo Bolsonaro. Para o relator, essa postura do ex-presidente influenciou a instalação do acampamento em frente ao Quartel-General do Exército, onde manifestantes pediam intervenção militar.

Hermeto considerou que houve falhas por parte de integrantes da Polícia Militar (PMDF), mas que foram potencializadas por erros de nomes que ocupavam cargos na SSP, indiciados pelo distrital, como Oliveira e Cíntia. O parlamentar escreveu no documento que todas as informações recebidas pelos oficiais foram prontamente acolhidas pelos policiais, dando direcionamento a elas.

A única exceção foi o coronel Casimiro Vasconcelos Rodrigues, ex-comandante da 1° Comando de Policiamento Regional (1° CPR) — responsável pelo batalhão da Esplanada. Hermeto considerou que o planejamento dos eventos daquele fim de semana era responsabilidade dele. Hermeto ponderou que o ex-comandante confiou no policiamento escalado para a Esplanada por meio do Departamento de Operações da corporação, que era pequeno. Porém, Hermeto também considerou que Casimiro ignorou a chegada de diversas caravanas ao DF naquele fim de semana, mesmo com a informação circulando em grupos de WhatsApp.

O emebedista pediu o indiciamento de Casimiro com base nos crimes de abolição do Estado Democrático de Direito; golpe de Estado; dano qualificado pela violência e grave ameaça, com emprego de substância inflamável, contra o patrimônio da União e com considerável prejuízo a vítima; e deterioração de patrimônio tombado.

Ao fim, Hermeto pediu que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, liberte os sete PMs alvos de denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR), que ainda não se tornaram réus, mas estão presos em uma ala para detentos policiais no Complexo Penitenciário da Papuda. Na última terça-feira, o próprio Moraes decidiu manter a prisão deles.

Entre os 135 indiciados, estão os empresários Joveci Xavier de Andrade e Adauto Lúcio de Mesquita; José Acácio Serere Xavante, conhecido como cacique Serere, preso por xingar o ministro Alexandre de Moraes; o empresário que financiou o indígena para estar em Brasília, Maurides Parreira Pimenta, conhecido como Didi Pimenta; o major da reserva da PMDF Cláudio Mendes dos Santos, acusado de ensinar táticas de guerrilha em frente ao Quartel-General do Exército; e a bolsonarista Ana Priscila Silva Azevedo. Os crimes variam, conforme o grau de participação de cada um, definido pelo relator e vão de incitação à animosidade das Forças Armadas e associação criminosa à abolição do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado.

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