Mark Cousins, destaque no É Tudo Verdade, desafia visão das imagens da história

Se existe uma linguagem capaz de ultrapassar qualquer barreira, talvez sejam as imagens. Ao menos é o que acredita o documentarista Mark Cousins, homenageado nesta edição do festival É Tudo Verdade, com sessões em São Paulo e no Rio de Janeiro até domingo (14).

“Eu já estive em muitos países, e onde quer que eu vá, o cinema surge como ligação universal”. Pela primeira vez no Brasil, ele compartilha o seu fascínio pelo documentário.

“Eu gosto de pensar no documentário como um ‘amor bruto’ sobre a vida. Você enxerga ela de forma apaixonada, mas igualmente cínica”. Reconhecido por seu papel como pesquisador, Cousins é celebrado pelo esforço historiográfico em suas discussões sobre o cinema.

Britânico radicado na Irlanda do Norte, vive hoje em Edimburgo, na Escócia, viajando o mundo para capturar registros que passam despercebidos ao olhar ligeiro.

“Quando você filma algo, você captura a realidade, mas também captura um ponto de vista e, por vezes, preconceitos. Você captura um fragmento daquele momento, cego para outras perspectivas”, compartilha Cousins, que teve oito filmes na programação do evento neste ano.

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Entre os selecionados, “Marcha Sobre Roma”, de 2022, busca ressignificar imagens históricas. “Os materiais de arquivo em geral são filmados por líderes poderosos, que buscam celebrar a si próprios e ampliar o seu alcance. Meu trabalho não pode reforçar essas intenções”.

A obra se baseia em um antigo filme, “A noi!”, de 1922, de Umberto Paradisi, produção fascista que exalta a Marcha sobre Roma, marco do da revolução fascista de Benito Mussolini.

Em uma palestra na Cinemateca Brasileira na última terça, Cousins apresentou pergaminhos, desdobrados em diversas páginas, como roteiros de algumas produções. Elas não seguem um formato tradicional. “Eu não sabia que os filmes de não ficção também eram dirigidos. Quando eu descobri que precisava moldar a realidade, fiquei muito animado”.

Cousins pensa seus projetos como uma espécie de organismo livre. “Lembro de um exercício no Iraque em que demos pequenas câmeras para um grupo de crianças, livres para filmar o que bem entendessem. O material filmado era melhor do que muitas das imagens que eu já havia feito”.

O seu “Uma História de Crianças e Filmes”, de 2013, também em exibição, discute a história da representação das crianças no cinema. “Alguns dos meus documentários favoritos não têm um impacto direto. Esse não precisa ser seu único propósito. O cinema pode ser usado apenas para celebrar a pureza de se estar vivo”.

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Seus enquadramentos também revelam um lado sensorial de comunicação com o mundo. A dança é um símbolo recorrente em seus documentários, presente ao resgatar cenas musicais de filmes que admira.

“Quando assistimos a algo, nosso corpo também reage. A sequência da dança em ‘Marcha sobre Roma’ era muito importante para desconstruir ideais fascistas. Eles não entendiam a alegria.”

Mesmo com as narrações em primeira pessoa, Cousins se compromete com a coletividade. “Apesar da minha presença, não acredito que meus filmes sejam necessariamente pessoais. Espero que cada um tenha a sua relação subjetiva com os projetos e possam pensar sobre a sua relação com o mundo”.

Ele convida todos a filmarem, por alguns minutos, todos os dias, e encoraja o uso do celular como nova técnica: “O celular é mágico. Estamos diante da primeira geração que não precisa de permissão para filmar, sempre tentando decifrar o mundo”.

Com o desenvolvimento de seu novo projeto, uma extensa jornada pela história do documentário, Cousins também diz que sua visita ao país tinha, claro, uma segunda intenção —captar imagens do Brasil.

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